Diretor da mais antiga faculdade de Direito do Brasil, a do Largo São Francisco, da Universidade de São Paulo (USP), e professor de Direito Administrativo, Floriano de Azevedo Marques Neto decidiu autorizar um grupo de estudantes a fixar uma faixa contra o fascismo no interior das arcadas da instituição. Era véspera do segundo turno da eleição.
Não demorou muito e um carro da PM parou ao lado da universidade. Os policiais queriam a retirada da faixa alegando se tratar de propaganda eleitoral irregular. Azevedo Marques disse não. Afirmou que havia autorizado a manifestação e não via nada de irregular. Pouco depois, foi a vez de guardas civis de entrarem na faculdade querendo arrancar a faixa. Mais uma vez encontraram a resistência de Azevedo Marques.
Sem ordem judicial, nada feito. Nem a polícia entraria na faculdade nem a faixa seria retirada. O exemplo do diretor da São Francisco foi citado pelo ministro Alexandre Moraes no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) quando a Corte manteve a liminar que proibiu a entrada da polícia em ambientes acadêmicos e reafirmou as liberdades de cátedra, de expressão e reunião, postas em risco por decisões de juízes eleitorais que confundiram a propaganda partidária com o debate de ideias e autorizaram ações nas universidades. Leia, a seguir, trechos da entrevista.
Qual a importância dessa decisão do STF sobre as liberdades de expressão, de reunião e de cátedra nas universidades?
O senhor acredita que a decisão do Supremo fere de morte o projeto Escola sem Partido?
Depende de como o projeto será. Se ele se limitar a vedar o proselitismo partidário e de um candidato, é uma coisa. Mas se for fazer triagem ideológica, não. O STF deixou claro isso nesta semana.
O senhor foi citado no voto do ministro Alexandre Moraes nos debates no STF. Como foi o episódio na Faculdade do Largo São Francisco com a polícia?
Os alunos me pediram autorização para pendurar a faixa. Como ela não era partidária nem comprometia o próprio público, eu a autorizei. Pouco depois, recebemos a visita de uma guarnição da Polícia Militar que espontaneamente, dirigiu-se à faculdade. Disse-lhes (aos policiais) que não havia ilegalidade alguma na faixa, pois se tratava de livre manifestação de um pensamento que, no caso, defendia a democracia e combatia o fascismo. Eles forma embora. Pouco depois, apareceu por lá um grupo de guardas civis dizendo que a faixa não era permitida. Também afirmei que a havia autorizado e não havia violação alguma à lei. Em, na ausência de ordem judicial, ela permaneceria lá. Os aguardas foram embora. Foram cordiais, mas nos surpreendeu a espontaneidade das ações desses policiais.
Outro fato repercutiu no mundo jurídico, a decisão de Sérgio Moro de aceitar o Ministério da Justiça. Como o senhor o analisa?
Não há nenhum impedimento legal à decisão do magistrado, desde que ele peça a exoneração. Mas essa decisão traz com ela algum risco de questionamento de isenção e imparcialidade, não pelo fato de ser juiz, mas pelo fato de ser um juiz importantíssimo em um processo que, inegavelmente, teve impacto na disputa eleitoral. A Lava Jato trouxe o combate à corrupção para o centro do debate. Creio que ele foi imprudente. E digo isso de forma tranquila, pois o próprio juiz Moro disse ao Estado que não aceitaria migrar para a política, pois não queria contaminar sua judicatura. Em relação ao País, no entanto, eu fico confortável. O juiz Moro tem uma biografia a zelar e pode ser até um parâmetros de contenção de medidas pouco conformes à Constituição que eventualmente estivessem sendo cogitadas.
Seria necessário aprimorar a lei e estabelecer uma quarentena para juízes e procuradores?
A quarentena é uma medida de profilaxia institucional para evitar, não a falta de isenção na condução, mas para a proteção da ação dos agentes públicos no exercício da função das críticas e suspeições posteriores. A quarentena se aplicaria para a migração a cargos executivos e às candidaturas.
Que consequências da campanha eleitoral preocupam o senhor para o futuro?
Tem uma claramente: a violência como vetor de ação política. Clausewitz dizia que a guerra é a política por outros meios. Eu diria que a política é negação da guerra. E a violência não é instrumento de ação política. Preocupou-me muito que no debate eleitoral a violência concreta ou simbólica tenha ocupado o lugar do debate político. O Judiciário deve coibir quem age com violência, demonstrando que a violência, em quaisquer de suas manifestações, em uma sociedade democrática não é tolerada: é crime.
Rumamos para a pacificação?
Quero crer que sim. O discurso do governo eleito caminha para isso. Acho que a nomeação do ministro Moro pode ter todas as críticas, mas caminha nesse sentido. O País só tem chance de sucesso se caminhar para a pacificação. Os exemplos históricos da escolha da violência são de destruição de países. Teremos um País com divergência, debate e antagonismo, mas sem violência retórica ou física. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.