

ANDRÉ LUIZ PAES DE ALMEIDA
Mestre em Direito pela PUC/SP. Advogado. Professor de diversos cursos preparatórios para OAB e Pós Graduação.
Sócio do Paes de Almeida e Garcia Advogados.
Dispõe o art. 848 da CLT, com a redação dada pela lei nº 9.022/95, que:
“ Terminada a defesa, seguir-se-à a instrução do processo, podendo o juiz, ex officio, ou a requerimento de qualquer juiz temporário, interrogar os litigantes”
A redação revogada tinha o seguinte teor:
“ Não havendo acordo, seguir-se-á a instrução do processo, podendo o presidente, ex officio ou a requerimento de qualquer vogal, interrogar os litigantes”.
A lei nº9.022/95, a rigor, procurou atualizar o dispositivo Legal denominado, tendo em vista a nova investidura dada então aos vogais, transformados em juízes classistas temporários (Constituição Federal de 1967, com a Emenda Constitucional nº 01/69).
Em ambas as redações o legislador utilizou-se da expressão interrogatório.
Com a extinção do juiz classista (EC nº 24/1999), o art. 848 encontra-se parcialmente revogado, o que, num esforço de atualização ensejaria o seguinte entendimento.
“Terminada a defesa, seguir-se-à a instrução do processo, podendo o juiz ex officio, interrogar os litigantes”.
A redação em apreço, falando em interrogatório, sem a menção ao depoimento pessoal das partes, tem levado inúmeros juízes do trabalho a sustentar extinto, no processo trabalhista, este último, o depoimento pessoal, indeferindo sistematicamente, reperguntas às partes, de que é o exemplo o r. despacho que transcrevemos:
“Registre-se que o juiz indeferiu o requerimento formulado pelo patrono da reclamada de formular reperguntas ao reclamante, tendo em vista a alteração legislativa ocorrida no Processo do Trabalho (art. 848 da CLT, com a redação da Lei nº 9.022/95), por força da qual o legislador adotou o sistema de interrogatório judicial, afastando o direito anteriormente previsto a respeito do depoimento pessoal”.
Com tal entendimento ficam as partes na impossibilidade de tomada de depoimento pessoal, inclusive em questões eminentemente fáticas.
Ora, com a devida vênia, como demonstramos, a lei nº 9.022/95 não alterou a redação anterior dado ao art. 848, quanto ao interrogatório, apenas atualizou o dispositivo legal quanto à figura dos vogais, na época convertidos em juízes temporários.
Já na vigência da redação revogada pela Lei nº 9.022/95, afirmava Russomano, com a autoridade que lhe é amplamente reconhecida:
“A consolidação está mal redigida. Não se pode nega o direito de um litigante tomar as declarações do litigante que se opõe às suas pretensões, para esclarecimento e fixação do debate. Não se lhe pode tolher a chance de arrancar, em juízo, uma confissão da parte quando seu procurador podem requerer o depoimento pessoal da parte contrária.”³
A mesma crítica era, igualmente, formulada por Sebastião Ribeiro de Oliveira, em seus Comentários à consolidação das Leis do Trabalho, em edição publicada anteriormente à Lei n°9.022/95:
“A consolidação, como observa Russomano (Comentários, II, p. 1.243), não foi feliz, na redação deste artigo, pois de sua leitura pode-se ter a impressão de que uma parte não seria admitida a formular perguntas para serem respondidas no depoimento de seu adversário, o que seria um absurdo. Não há, entretanto, quem defenda esta interpretação rigorista do dispositivo em causa. Basta, aliás, interpreta-lo em sistema com o art. 820 da própria CLT, para que se desfaça aquela primeira impressão. Por outro lado, o direito comum subsidiário, nesta como em outras omissões, prescreve que o depoimento pessoa será tomado pela mesma maneira prescrita para a tomada de depoimento das testemunhas, no qual é assegurada a formulação de quesitos pelas partes, sempre, é claro, por intermédio do juiz.”
Vê-se, pois, quanto equivocada é, a afirmação de que a lei 9.022/95 pôs fim ao depoimento pessoal no Processo do trabalho. A lei nominada nada alterou com relação ao interrogatório, já contido na redação anterior, bastando que se consulte a CLT, anteriormente a 1995. Ambas as redações manifestamente equivocadas, e em inequívoco antagonismo à denominada Teoria Geral do Processo.
I – O interrogatório e o depoimento pessoal
Na lição da Luiz Dall’ Agnol
“O interrogatório das partes (CPC, art.342), não se confunde com o depoimento pessoal das mesmas (art. 343); aquele pode ser determinado mais de uma vez, em qualquer fase do processo, ao passo que o segundo, é colhido apenas uma vez, em audiência.”5
Do que se conclui que o interrogatório (ato do juiz) pode ser determinado a qualquer momento no decorrer do processo, cabendo a parte postular, em audiência, o depoimento pessoa do ex-adverso.
Coqueijo Costa, em consagrada, observa que:
“A interpretação do Direito Processual do Trabalho não pode fugir das regras básicas da interpretação do Direito Processual Civil.”
Dentre tais regras cumpre por um relevo o contraditório e a repartição das provas.
A inquisitoriedade do processo do trabalho não pode ser levada ao extremo do Direito Penal, acusatório em suas linhas gerais.
Com efeito, o princípio inquisitorial do Processo do Trabalho, não significa afastamento dos princípios gerais do processo, dentro os quais merece destaque o direito concedido às partes à tomada de depoimento do ex adverso.
Como põe em relevo Jorge Pinheiro Castelo:
“A autonomia do direito processual do Trabalho não pode significar isolamento.
Pelo contrário, o direito processual do Trabalho integra o direito processual. Por isso, deve observar a unidade de raciocínio da teoria geral do processo ligada ao objetivo final e comum a todos os ramos do direito processual, que é atender os escopos do sistema processual da natureza social, política e jurídica. Além disso, deve aproveitar os conceitos extraídos da teoria geral do direito processual, ou de qualquer segmento do direito processual, que possam ser tidos como universais, ou, pelo menos, aproveitar o método de raciocínio utilizado.”
Observe-se, outrossim, que os objetivos do interrogatório e do depoimento pessoal são distintos. O interrogatório, determinado pelo juiz, em qualquer fase do processo, visa esclarecer o magistrado sobre os fatos da causa. O depoimento pessoal, ao revés, é o meio através do qual se busca a denominada confissão provocada.
No magistério do Moacyr Amaral Santos:
“No interrogatório as partes comparecem para elucidar os fatos da causa, com a finalidade de facilitar sua instrução probatória ou o julgamento da lide. De tal modo, o interrogatório poderá ser um único ou vários, conforme o considerar necessário ou útil o juiz, à medida que o processo se movimente, diversamente do depoimento pessoal que é um único, a realizar-se na audiência de instrução e julgamento (art. 343), salvo a hipótese de audiência antecipada (art. 847).”
Por isso que, com a precisão, o Código do Processo Civil, distinguindo o interrogatório do depoimento pessoal, não afasta o direito da parte à obtenção da confissão:
“Art. 342 – O juiz pode, de ofício, em qualquer estado do processo, determinar o comparecimento pessoal das partes, à fim de interrogá-las sobre os fatos da causa.
Art. 343 – Quando o juiz não o determinar de ofício, compete a cada parte requerer o depoimento pessoal da outra, a fim de interrogá-la na audiência de instrução e julgamento.”
Observe-se que, considerando o comparecimento obrigatório das partes, no processo do trabalho (art. 843 da CLT), e a audiência única (art. 849 da CLT), o momento para postular o depoimento pessoa do ex adverso, è na própria audiência, independentemente de interrogatório do juiz.
Prova eloquente do equívoco da interpretação restritiva, é o art. 820 da CLT, deixando patente o direito das partes ao depoimento pessoal:
“As partes serão inquiridas pelo juiz ou presidente, podendo ser reinquiridas, por seu intermédio, a requerimento dos juízes classistas, das partes, seus representantes ou advogados.”
Excluídos os juízes classistas (EC. nº 24/1999), subsiste, de forma inequívoca, o direito da parte ao depoimento pessoal.
Cerebrina se nos afigura a interpretação restritiva do art. 820 da CLT, no sentido de que a reinquirição dependa da inquirição. Inexistindo esta, inexistiria aquela.
Ao revés, robustecendo o direito ao depoimento pessoal, independentemente do interrogatório, dispõe a Súmula 74, do TST, I:
“Aplica-se a pena de confissão à parte que, expressamente intimida com aquela cominação, não comparecer à audiência em prosseguimento, na qual deveria depor.”
Fácil é verificar, portanto, que o interrogatório não afasta o direito das partes ao depoimento pessoal, como, aliás, ressalta Bolívar Viegas Peixoto:
“Discute-se o interrogatório pode ser requerido pelo litigantes.
Entendem alguns poucos que esta medida é privativa dos juízes.
Podemos concluir pelo texto da lei que não há limitação aos julgados para esta tomada de interrogatório porque a autorização àqueles não desautorizam o deferimento de qualquer das partes nesse sentido”
Por isso, oportuna se nos afigura a advertência de Sérgio Pinto Martins:
“Não ouvir o reclamante ou o reclamado, quando há requerimento da parte, para esse fim, constituiria cerceamento de prova das partes, salve se a matéria fática não fosse controvertida ou a questão fosse matéria de direito, pois a parte busca obter da outra a realidade do que teria ocorrido na relação entre ambos.”
Com inequívoca propriedade o pranteado Valentim Carrion observa que:
“O interrogatório dos litigantes é, com frequência, peça fundamental da instrução.
Dificilmente a parte deixa de confessar algum ou muitos aspectos da controvérsia, seja por sinceridade, inadvertência ou definição de generalidades da pretensão.
Equivoca-se o magistrado que, por excesso de serviço e desejo de celebridade, dispensa o depoimento pessoal da parte, que poderá simplificar-lhe e às vezes tornar desnecessário o das testemunhas.”
E, concluindo, afirma o douto magistrado e jurista:
“O texto do art 848 “podendo o presidente…” contraria o mínimo senso de lógica e do princípio geral do processo. O depoimento das litigantes é a mais pura e direta fonte de informação e convicção; o ônus da prova que pesa sobre cada uma das partes não pode depender da disposição do juiz em ouvir ou não o adversário, e seu indeferimento constitui gravíssimo cerceamento de defesa.”
Por violar o direito das partes, contrariando, outrossim, os princípios gerais do processo, facilmente se conclui pelo equívoco do legislador, não fazendo menção ao depoimento pessoal no art. 848 da CLT, não fosse conhecido o açodamento dos nossos legisladores.
A omissão, lamentável sobre todos os aspectos, e a certeza de que não houve intenção predeterminada de abolir-se o depoimento pessoal, facultado será, ao advogado, frente ao radicalismo de alguns juízes, invocar a aplicação subsidiária do art. 343 do CPC, aplicação essa autorizada pelo art. 769 da CLT – “nos casos omissos, o Direito Processual Comum será fonte subsidiária do Direito Processual do Trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste título”
II – Confissão
O CPC conceitua:
Art. 345. Quando a parte, sem motivo justificado, deixar de responder ao que Ihe for perguntado, ou empregar evasivas, o juiz, apreciando as demais circunstâncias e elementos de prova, declarará, na sentença, se houve recusa de depor.
A sumula 74 do TST prerroga sobre a confissão:
Súmula nº 74 do TST
CONFISSÃO. (nova redação do item I e inserido o item III à redação em decorrência do julgamento do processo TST-IUJEEDRR 801385-77.2001.5.02.0017) – Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011
I – Aplica-se a confissão à parte que, expressamente intimada com aquela cominação, não comparecer à audiência em prosseguimento, na qual deveria depor. (ex-Súmula nº 74 – RA 69/1978, DJ 26.09.1978)
II – A prova pré-constituída nos autos pode ser levada em conta para confronto com a confissão ficta (art. 400, I, CPC), não implicando cerceamento de defesa o indeferimento de provas posteriores. (ex-OJ nº 184 da SBDI-1 – inserida em 08.11.2000)
III- A vedação à produção de prova posterior pela parte confessa somente a ela se aplica, não afetando o exercício, pelo magistrado, do poder/dever de conduzir o processo.
O art. 844 da CLT também destaca sobre revelia, tratando-se da confissão ficta, que se difere da expressa que somente ocorre quando a parte comparece e declara os fatos.
As pessoas jurídicas de direito público sujeitam-se a revelia, como se depreende da OJ 152, da SDI-1 do TST, mas isso não quer dizer que sujeitam-se a confissão ficta, já que tal fato é controvertido.
Carlos Henrique Bezerra Leite destaca:
“Quanto à confissão ficta, pensamos que ela não se aplica às pessoas de direito público, por serem os bens públicos indisponíveis, impenhoráveis e inalienáveis, razão pela qual deles não pode dispor o administrador público, salvo, é claro, quando houver lei que autorize a transação.
É o que ocorre, por exemplo, com a hipótese prevista da Lei 9.469/97, cujo art. 1º. faculta ao Advogado Geral da União e aos dirigentes máximos dos órgãos da Administração Pública Federal realizar acordos e transações nas causas até o valor de R$ 50.000,00. Assim, ocorrendo revelia da União ou de seus entes descentralizados em causas até R$ 50.000,00, torna-se factível a confissão ficta. Acima desse valor, não há lugar para a confissão ficta do referido ente público.”
Devemos ainda diferenciar revelia de confissão. Revelia é ausência do reclamado em audiência e a confissão é uma consequência da revelia, no caso de forma fictícia.
III – Elementos da Confissão
IV – Indivisibilidade da Confissão
Segundo prescreve o art. 354 do CPC, a confissão é, em regra, indivisível.
Délio Maranhão, citando Gabriel de Rezende Filho em Instituições de Direito do Trabalho destaca:
“uma vez que a parte reconhece o fato afirmado pelo adversário, mas acrescenta uma qualidade que modifica essencialmente a natureza jurídica deste fato ou alega fato novo, extintivo ou modificativo do direito do adversário, poderá ser perfeitamente dividida a confissão, aceitando o juiz a primeira parte e rejeitando a segunda se o confidente não conseguir provar cumpridamente suas afirmações”
V – Revogação da Confissão
Pode-se afirmar que a confissão é irrevogável (art. 214, do CC, que revogou , em parte, o art. 352, do CPC):
“A confissão é irrevogável, mas pode ser anulada se decorreu de erro de fato ou de coação.”
As pessoas jurídicas de direito público sujeitam-se a revelia, como se depreende da OJ 152, da SDI-1 do TST, mas isso não quer dizer que sujeitam-se a confissão ficta, já que tal fato é controvertido.
Carlos Henrique Bezerra Leite destaca:
“Quanto á confissão ficta, pensamos que ela não se aplica às pessoas de direito público, por serem os bens públicos indisponíveis, impenhoráveis e inalienáveis, razão pela qual deles não pode dispor o administrador público, salvo, é claro, quando houver lei que autorize a transação.
É o que ocorre, por exemplo, com a hipótese prevista da Lei 9.469/97, cujo art. 1º. faculta ao Advogado Geral da União e aos dirigentes máximos dos órgãos da Administração Pública Federal realizar acordos e transações nas causas até o valor de R$ 50.000,00. Assim, ocorrendo revelia da União ou de seus entes descentralizados em causas até R$ 50.000,00, torna-se factível a confissão ficta. Acima desse valor, não há lugar para a confissão ficta do referido ente público.”